19 de maio de 2011

A VIOLENCIA BASEADA NO GENERO NA VISAO DE PAULO MUXANGA

A Violência Baseada no Género como Factor de Propagação do HIV/SIDA nas Mulheres


Paulo Muxanga

O debate, em torno da Violência Baseada no Género (VBG), tem estado a crescer nos últimos anos. Os esforços têm se multiplicado, quase que em todo o mundo, visando combater a prática deste tipo de violência. Há uma consciência mundial do impacto devastador, na sociedade, causado pela prática impune e reiterada da VBG. Defensores dos direitos das mulheres mobilizam-se, dentro e fora dos países e regiões, para conseguir mudanças significativas em padrões e políticas nacionais, regionais e internacionais, abordando a questão da VBG. Mergulhados nesta onda, aproveitando, ainda, o entusiasmo, gerado pela campanha mundial dos 16 dias de activismo pelo fim da violência contra as mulheres, na sua edição de 2010, pretendemos, com esta reflexão, discutir a relação que se estabelece, entre a VBG e o HIV/SIDA, e as consequências dai resultantes, destacando, de modo particular, a África Subsaariana.

A VBG refere-se, de acordo com Schmidt e Nice, à violência sofrida por causa de ideias sobre o que significa ser um homem ou uma mulher e, esta, inclui violência contra a mulher (VCM), mas também, a discriminação baseada na orientação sexual ou mudança da identidade do género. Os homens e rapazes homossexuais tambem sofrem VBG, entretanto, esta afecta, desproporcionadamente, as raparigas e a mulher.

Por seu turno, a Declaração de Beijing e respectiva Plataforma de Acção, definem a violência contra as mulheres como “qualquer acto de violência baseada em género que resulte ou que seja provável que resulte em prejuízos físicos, sexuais ou psicológicos às mulheres [e raparigas], incluindo a ameaça de tais actos, a coerção ou privação arbitrária da liberdade, quer ocorra em público quer na vida particular.”

A violência é, geralmente, dirigida, especificamente, contra as mulheres, por diversas razões, sendo de destacar as relações de poder desiguais, em prejuízo da mulher, dentro das famílias, comunidades e Estados. Esta situação tem contribuído para a restrição do direito das mulheres a manifestarem as suas vontades e desejos, a exporem os seus pontos de vista e posicionamentos, bem como, a decidirem sobre questões que lhes digam, directamente, respeito, como é o caso das questões sexuais e reprodutivas.

No fórum familiar, por exemplo, onde os homens são dominantes, sendo, por isso, detentores das prerrogativas de decisão sobre as condições em que as práticas sexuais e reprodutivas devem ocorrer, o poder de barganha da mulher é fraco, o que aumenta o risco de sua exposição à práticas sexuais inseguras, podendo resultar na contaminação pelo HIV/SIDA. Por outro lado, raparigas adolescentes, vivendo em meio familiar, estruturalmente violento, como sucede em muitas sociedades, estão sob risco ainda maior de exposição ao HIV/SIDA, uma vez que elas também podem ser vítimas de abuso sexual por membros mais velhos da família, parentes próximos e vizinhos.

Enquanto isso, ao nível da comunidade, para além de outros riscos, as mulheres também estão expostas ao risco de violência sexual, ao buscarem água, lenha e fazerem trabalho agrícola. As raparigas estudantes são pressionadas a sucumbir ao assédio sexual de homens mais velhos para pagar pelos livros escolares e pelas despesas pessoais, bem como, pelos próprios professores (como forma de facilitarem a sua passagem de classe) e colegas. Em algumas culturas, há uma crença de que a prática de sexo com virgens mantém os homens jovens e evita ou cura a infecção por HIV. Isso tem reforçado a tradição de encorajar o casamento na infância, o que também expõe as mulheres a riscos acrescidos de contaminação pelo HIV/SIDA.

Os dados disponíveis indicam que a proporção de mulheres infectadas pelo HIV/SIDA está crescendo em níveis mais altos do que a dos homens, sendo, as mulheres, de 2.5 a 8 vezes, mais susceptíveis de contraírem infecção que os homens. Em 2001 , estimou-se que, de 6 a 11% das mulheres africanas em idade, entre 15 e 24 anos, eram HIV positivo, comparado com o índice de 3 a 5% para homens jovens. Na África Subsaariana é tida como aquela que apresenta os mais elevados índices de seroprevalência. Em 2007 , por exemplo, a região apresentava uma taxa de 35 por cento de todas as pessoas que vivem com Sida no mundo e 32 por cento das novas infecções que ocorrem no planeta. Ainda nesta região, actualmente, estima-se que, 58% das pessoas infectadas com HIV/SIDA, são mulheres, tendo, na vasta maioria, a transmissão da infecção, sido através de seus maridos. Estes dados, tornam as desigualdades de género e seu impacto ainda mais visíveis.

Moçambique, País integrante da África Subsaariana, apresenta, segundo dados do INSIDA (2010), uma taxa de seroprevalência de 11.5 por cento, na faixa etária dos 15 aos 49 anos, sendo as mulheres as mais infectadas pelo HIV/SIDA, com uma taxa de 13.1%, contra 9.2% dos homens, em todas as províncias, excepto Niassa, onde a taxa de infecção, nos homens é mais alta - é de quatro por cento, contra três nas mulheres.

Algumas correntes defendem que a alta taxa de infecção pelo HIV/SIDA, em mulheres e raparigas, está ligada a questões fundamentais de poder e controle e à forma como a sociedade fecha os olhos para o comportamento dos homens, que exercem poder e controle sobre as mulheres, sendo que, a manutenção do aumento da taxa de infecção nas mulheres, resultará numa queda na força de trabalho das nações e no aumento da pobreza dentro das famílias. Isto atinge profundamente a produção de alimentos e as economias nacionais, uma vez que a maioria das mulheres africanas actua na produção agrícola. Também, tem se tornado cada vez mais visível a existência de uma forte ligação entre o HIV/SIDA e a pobreza. Por outro lado, a manutenção desta situação, compromete os esforços de promoção do desenvolvimento sustentável, bem com, o alcance das metas de desenvolvimento do Milénio, sobretudo, os números 3 e 6. Pelo que, se nada for feito para empoderar cada vez mais as mulheres, permitindo algum equilíbrio nas relações de poder, entre homens e mulheres, as mulheres e raparigas continuarão a sofrer as respectivas consequências negativas, cujos impactos se reflectem, como foi visto, na sociedade como um todo.

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